Às vezes lembro-me dele. Conheci-o antes de conhecer qualquer outro professor. Ainda não sabia ler, tinha cinco anos acabados de fazer, quando me iniciei nas lides. Nunca fui brilhante naquilo e, tanto eu como ele sempre soubemos que jamais faria carreira por ali ou sequer reconheceria num instrumento o meu hobby da vida. Mas a música, como a dança, cruzam o nosso caminho para nos determinarem sensações, sensibilidades, gostos, enfim. Além disso, desde cedo que nos uniu uma amizade infinita. Um querer bem que o fazia nunca esquecer a almofada no piano nas festas de fim de ano, me fazia escrever-lhe postais no Natal e no aniversário. Uma amizade que justificou que por lá ficasse tantos anos: doze, uma dúzia deles. Mais para ter uma hora de conversa da boa com alguém crescido e que me devolvia, na volta das dúvidas maiores, respostas sempre coerentes. Não nos vemos há anos. Às vezes falamos e, quando menos espero, de tempos a tempos aparece um postal dele na caixa de correio dos meus pais. O meu professor de música é daqueles personagens incontornáveis da minha vida. E há dias em que me lembro dele. E de quando dizia "Aí vem o A., o homem que domina a pantera depois de morta!" ou desvalorizava a nossa falta de confiança nas pequenas grandes conquistas da vida com um "Faz-te uma mulher, já que o teu pai nunca o foi!". Tenho um bocadinho de saudades dele. E daquele sábados à tarde. Do caminho, de bicicleta, com os livros no cesto cor de rosa.
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