sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Sentimentês

Se sou fraquinha a línguas em geral, não causará grande mossa nas vossas mais remotas expectativas de que ainda se aproveite alguma coisa no convívio comigo descobrirem que estou muito longe de ser brilhante também nessa magna língua que é o sentimentês. O sentimentês, vocábulo à pressa inventado por moi même, à falta de outro melhor e imaginação para mais, é a língua dos sentimentos, aquela com que devemos expressar os batimentos cardíacos, a velocidade a que as borboletas voam na nossa barriga e a temperatura macabra a que correm suores pela nossa testa abaixo. Pois bem... fique assente que sou um bocado limitada em sentimentês. Digo-o com um desgosto quase tão grande como o que ponho nas declarações de "Eu já nem durmo, só de pensar que tenho esse congresso... Permita o Sócrates que não haja financiamento para tanto.". Mas a verdade, verdadinha, que não estou aqui para enganar ninguém, é que, como nas outras línguas em que temos a mania que até mandamos uns bitaites, também em sentimentês eu sistematizo tudo na minha cabeça, organizo as ideias, encadeio os raciocínios, escolho as melhores palavras, treino a dicção enquanto me penteio e até faço jeitinhos com os lábios a ver se devo abrir ou fechar mais as vogais... para depois... parecer uma recém chegada de Marte a tentar perceber qual a senha que me compete tirar na Secretaria Geral. É que, chega a hora da verdade e nada de mais oportuno que o tempo me ocorre comentar. Como quando nos perguntam como é que se vai para a Sé Velha e só nos sai downstairs, tal qual não houvesse toda uma alta da cidade com ruas e cruzamentos e encruzilhadas... Sentimentês, minha gente, é língua tramada de aprender. Não tem declinações, mas facilmente nos faz cair em tentação. Pode viver muito bem sem verbos, mas parece que nos obriga a calar o presente, angustiados pelo passado e crentes que o futuro, sozinho, há-de encontrar o caminho, que não é burro nenhum. Sentimentês nem deve viver de grandes figuras de estilo e, ainda assim, não passa sem nos fazer sentir, com eufemismos, a caganeta do cão zarolho e coxo. Sentimentês não é para todos. Embora, lá está, linguagem gestual, tenho para mim, seja cadeira de precedência. Sentimentês, se calhar, nem é língua que se diga, mas só emoção que se sinta. É tramado, sentimentês. Digo-vos eu. E mais não sei.

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