sábado, 30 de junho de 2012

Não sou eu que digo #9

O que é ser português? O que nos diferencia dos alemães ou dos americanos ou de qualquer outro povo do Mundo? Será que realmente há diferenças assim tão visíveis? No dia da nossa meia-final do europeu, fomos jantar a um restaurante chamado Cova Funda, curiosamente também conhecido por outro nome, que aqui me vou abster de referenciar, até pelo resultado do dito jogo. Ora naquele local é comum ser surpreendido com fado e seus intérpretes, o que também aconteceu nessa noite e por ali fomos ficando e escutando aquela música que dizem nos representa, que é a nossa essência como povo. Devo admitir que durante muitos anos foi música que abominei e da qual fugia a sete pés, mas diz-se que com a idade, para além das maleitas, também vem o saber e progressivamente também eu aprendi a apreciá-la. A dado momento, ouvem-se os acordes quase chorados de uma balada acompanhados da voz sofrida do fadista, momento tão apropriado ao estado atual do país, em que sofremos com o desemprego, com os cortes de salários, com a miséria, ai pobres de nós que o Mundo acaba e ninguém nos salva e ali ficámos uns minutos a ouvir e a carpir mágoas comuns em silêncio. Logo a seguir, quase sem pausa para respirar, irrompe um daqueles fados vadios, cheios de trinados e cantares desgarrados, que a todos entusiasma e surgem as palmas ritmadas e os sorrisos abertos e todos os males são espantados, como se se estivessem a sacudir lençóis garridos para estender na cama lavada.
Ao pensar naquela sequência de músicas, pensei que também nós portugueses somos um pouco assim, capazes de grandes depressões, momentos em que estamos à beira do abismo a olhar para o fundo e quase pedimos que venha alguém e nos dê um pequeno empurrão, eis que do nada surge uma aberta nas nuvens negras e o Sol começa a brilhar tão intensamente que esquecemos todos os problemas, todas as preocupações e voltamos a querer viver e estar e beijar e dançar. Não é certamente só isto que nos distingue, esta capacidade de nos reinventarmos, de fazer das fraquezas forças, mas parece-me que é claramente coisa nossa, intrínseca e intemporal e que nos permite tantas vezes avançar, mesmo com tudo contra nós. Por um lado era bom sermos daqueles povos que estão sempre no topo das listas de felicidade, mas acho que assim apreciamos mais a viagem, sentimos mais todas as incidências do trajeto e por mim (quase sempre) gosto que assim seja.

Porque já há uns tempos que ele por cá não dizia nada.

1 comentário:

  1. Já assim assisti a alguns fados no Cova Funda (sim, e espanhol...) e realmente os jantares pela porta traseira (cave-cova), eram os preferidos... os mais escondidos. Os melhores.

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