sexta-feira, 12 de novembro de 2010

E não deixavas de trabalhar?!

Perante esta pergunta, cheguei à conclusão que nada da minha vida profissional, ou muito pouco, mudaria se eu fosse rica. Porque o que eu não gosto é apenas um caminho para chegar ao que quero. Se fosse rica, bem, compraria ainda mais livros, possivelmente, mas, enfim, já não tenho tempo para ler nem os que compro não sendo... Pensando bem, não há nada de relevante que ser rica pudesse mudar na minha vida, pelo menos profissional. Vejamos. Dos três trabalhos que tenho, não conseguiria abdicar de nenhum, portanto, enfim... O que me leva mais tempo, o que talvez me realize mais, corre o risco de acabar, mas não era por eu ser rica que poderia alterar isso. É um projecto com uma dimensão social que me parece ter muito sentido se houver investimento público. Em suma, não acho que um Observatório particular fosse a solução. É, de longe, das coisas que mais gosto de fazer. Custa-me muito pensar num fim anunciado. Vou sofrer muito se tiver de me retirar desta vida. Acho que pouca gente percebeu a importância disto. Mas a importância, sem preço, vê-se nas reuniões de discussão de vidas pequeninas, vê-se nas formações, vê-se nos arrepiar de alguns caminhos pouco ponderados que às vezes tinham começado a ser trilhados. Depois, os outros dois trabalhos são aulas. E toda a gente sabe que eu adoro ser professora. Não teria provavelmente paciência para outro nível de ensino, mas aqui, bem, adoro discutir. Há dias em que a coisa corre melhor, há dias em que corre pior. Não consigo decidir-me por nenhuma de duas áreas de eleição. E tenho a sorte de uma já me estar destinada num dos sítios. E de ter uma turma pós laboral que me fez redescobrir o gosto de uma boa aula. Amo. Ganho aí energia para ir levando o sacrifício (é mesmo) de ter de penar durante uns tempos numa área de que não gosto, não gosto, não gosto, no outro sítio. Mas, mesmo aqui, enfim, estou em casa. Tem coisas más, péssimas, mas ando por lá desde os 17 anos. E tenho esperança de um dia, não sei quando, me deixarem fazer o caminho que eu ambiciono e não o caminho que precisam que eu faça. Tirando isto, faço a chamada advocacia caseira, que me dá um prazer mais que sabido, adoro dar aulas para públicos diferentes, formações para gente que não seja da área jurídica, e rendo-me, babo, literalmente, quando recebo um convite para uma conferência. Portanto, faço o que gosto. Sobra a bendita tese de doutoramento. Aqui, bem, aqui a conversa é outra. Gosto de aprender, mas não gosto de deadlines. Gosto de investigar, mas não aprecio pressões. Gosto de escrever, mas não me animo muito com regimes forçados e demasiado longos de clausura. Faço uma tese (tento) porque é a única maneira de me garantir, dentro do possível, manter naqueles trabalhos de que gosto. Nunca neguei que há coisas muito melhores para ocupar os dias do que estar enfiada em casa a ler desalmadamente literatura jurídica. Enfim... Mas é preciso. Tem de ser. E o que tem de ser tem muita força. Por isso, tentemos tornar a coisa o mais prazenteira possível (?!). Se eu fosse rica, bem, viajava mais, viajava muito, corria mundo, falava com gente, cheirava lugares, olhava pores do sol e amanheceres em muitas paisagens, mas não, não deixava de trabalhar. E, nos próximos quatro anos, tinha de refrear um bocadinho os ímpetos... porque não podia deixar de parir uma tese de doutoramento. De resto, comprava uma casa. Ajudava muita gente que precisa e que não está longe de mim e remodelava o conceito de institucionalização em Portugal. Pagava ao Primeiro para me deixar mandar nisso, só nisso. Era assim, se eu fosse rica. Acho eu. Mas também me podia subir o dinheiro à cabeça e dar para estúpida. Às vezes, acontece!

2 comentários:

  1. Tu mereces muitas coisas boas da vida, oxalá ela não seja parva e tas dê. Adoro a frase:"Mas também me podia subir o dinheiro à cabeça e dar para estúpida." É do melhor que a literatura portuguesa tem visto em muitos anos. A sério.

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