sábado, 12 de março de 2011

Da manifestação... em conclusão

- Não fui.
- Fiquei a trabalhar.
- Não vale a pena alongar-me. Já toda a gente sabe que estagiei sem remuneração, trabalhei a recibos verdes, sou precária e acumulo três trabalhos remunerados com uma tese de doutoramento e biscates.
- Escolhem a dedo quem entrevistam nas manifestações e isso é coisa para me deixar sempre em prantos. É que escolhem mal. Do menino que não sabe a diferença entre ao encontro e de encontro, à senhora que se esforça, sem convencer, por falar caro (tenho alergia a sucessões de palavras caras que espremidas não dão nada), ou à ex-aluna que ali vi (sofrível).
- Não acredito nestas manifestações. Participei nelas como estudante e sei no que (não) dão.
- É conhecida e já foi suficientemente escrutinada a minha intolerância às grandes equipas. Não podemos responder por todos e isso aflige-me porque há sempre, sempre, mas sempre, os que fazem e os que assinam. Os que assinam são os válidos. E toda a gente sabe o pó que tenho a válidos.
- Provaram-me, por A+B, que, mais uma vez, os bem intencionados e dignos mandatários dos protestos mais nobres seriam engolidos por demagogias e populismos decantados em cantigas e palavras de ordem pouco eficazes.
- Tenho pesadelos quando penso no governo. Mas também tenho pesadelos quando penso na oposição. Tenho pesadelos quando penso, em geral, na classe política. Os bons, que os há, são engolidos pela máquina e formatados a acenar com a cabeça. E isso, paulatinamente, tem afastado a minha esperança na actividade de quase todos.
- A sensação é muito parecida com a que tive quando, depois de anos a separar o lixo, percebi que tanta, tanta, tanta, mas tanta, tanta gente ainda não o faz. E já não tenho o lirismo dos tempos em que levava a sério a ideia de que um bater de asas de uma borboleta no pacífico poderá ser o causador dos males que assolem o outro lado do mundo.
- Às vezes já não separo o lixo.
- Já me indispus muitas vezes por recusar repetidamente meter-me na política. Mesmo naquela de ao pé da porta.
- Não sou uma anarca. Mas não quero, porque sei que não seria sequer razoável nesse papel, ser política.
- Nunca quis ser médica e de cada vez que vou aos HUC trago um ódio de estimação. E critico-os. Porque também não sou palonsa ao ponto de embarcar no fado típico do só pode criticar quem souber fazer melhor. Não. Neste caso, tenham lá paciência, mas não pode ser bem assim. Escolhemos o que queremos fazer. Às vezes, não escolhemos, mas comprometemo-nos a fazer. Então, é para tentar ser o melhor. Não há lugar para fracos. E os mais ou menos um dia têm de descer do muro. Atenção: eu disse tentar ser o melhor. Não podemos todos ser o melhor. Mas podemos todos tentar ser o melhor.
- Há-de haver quem queira tentar ser o melhor. Mesmo a sério. Bolas... há quem queira ser médico legista, há quem queira ser coveiro, há quem queira ser limpa-chaminés, há quem queira ser pastor, há quem queira ser bolseiro, há quem queira passar a vida fechado em bibliotecas... Deve haver quem queira ser bom político. Mesmo.
- Não nutro admiração alguma por quem não vota.
- Gostava muito que as manifestações se fizessem aí. Ninguém presta? Tudo às urnas. Voto em branco, riscanhadas ou desenho artístico no boletim.
- Agora isto, isto não. Desculpem lá, mas não. Isto, meus amores, só me faz pensar na frase que um dia me disseram e que reza assim "Não facilite. Nunca facilite. Pagará caro ter facilitado. Nunca me arrependi de ter chumbado uma pessoa. Já me arrependi muitas vezes de ter passado algumas.".
- Sou pelo desconto dos erros ortográficos e, mais do que isso, pior, para mim, de construção frásica. Hoje estava embevecida a ler a opinião de uma blogger sobre a manifestação até que pousei a vista na palavra contraCto. Não fui capaz de reter nadinha do que a moça escreveu. É que a moça começava por um intróito de umas dez linhas onde justificava a sua desolação por, afinal, ser muito qualificada, ser licenciada e mestre e o raio e ter cargo de chefia e tanta responsabilidade, oh tanta responsabilidade...
- Gostava de pensar que vivia num país que não embandeirava o ensino superior sem mais. Costumo dizer que ser dr. é quase ofensivo hoje em dia, tal o despropósito com que o título se apresenta.
- Gosto de gente, detesto títulos. Rio-me de quem assina com o título em precedência. Acho uma pobreza de espírito. Pior, só quem debita o preço de tudo o que compra, sobretudo quando só compra coisas muito caras.
-A solenidade das ocasiões faz-se da massa crítica dos Homens que as enquadrem. E só me restaram dúvidas sobre a solenidade deste protesto.
- Gosto de quem trabalha.
- Uma das minhas aversões de estimação são os empregados de mesa que passam as horas de almoço e jantar de um lado para o outro nos restaurantes, que suam em bica, e que nunca vemos com um prato na mão.
- Esta, lamento, ou então não, é a minha conclusão.

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