Aos 31 anos, quando nos dizem "Não vai morrer disso, mas compreendo quando me diz que é insuportável viver assim!", percebemos que está na hora de fazer alguma coisa. Há pouco menos de um ano que a saga começou. Tenho tentado viver para contar os dias em que supero esta mão gigante a apertar-me o coração, esta náusea constante, este suor frio que me gela as mãos, este latejar de uma puta de uma veia aqui do lado direito da cabeça. Felizmente, desde o dia em que a C. me levou ao hospital, não voltei a sentir aquele medo maior que se traduz numa sensação de morte iminente, mas, entre dias melhores e dias menos bons, a travessia não tem sido 100% pacífica. A viagem a Espanha foi um período de superação, onde a minha grande vontade era dar meia volta e vir refugiar-me no meu canto conhecido. Não é bem uma fobia social, que há dias em que gosto muito de ver gente, mas não deixa de ser verdade que chorei, mas chorei mesmo, quando, no domingo, com a casa cheia de gente, me apercebi que tinha louça que nunca mais acabava para arrumar e cinco faqueiros diferentes para organizar. Acentuou-se a mania da perfeição e o síndrome da confirmação. Levanto-me para ver se a porta está mesmo fechada, volto atrás dez vezes para verificar os bicos do fogão, mesmo que não cozinhe há dois ou três dias, revejo os artigos ou as apresentações de power point de uma forma desesperada e faço aquele movimento involuntário de quando se engole em seco, sempre que me lembro do doutoramento. Não tenho medo de dar aulas, nunca tive medo de fazer uma conferência, sei, sem falsas modéstias, que comunico razoavelmente e que, nos meus melhores dias, consigo fazer o meu trabalho bem. Às vezes, muito bem, até. Mas ontem dei a aula sentada e cada pergunta, cada inquietação, cada dúvida, era uma provação difícil de superar. E ontem, à noite, fiz uma conferência sentada. E no mais íntimo do meu peito soou o tempo quase todo um desejo grande que não houvesse debate. Estou intolerante ao barulho. Apetece-me esbofetear quem fala alto. E quem fala muito. Estou sem paciência. Estou cansada. Agravo este estado de coisas por não me rever nesta pessoa pouco alegre em que me transformo nestes dias, torno-me impaciente comigo mesma, intolerante ao meu próprio estado de sítio interior. Sempre gostei de conduzir, mas a verdade é que ontem não consegui. Não consegui. Gosto de doces, mas ontem não almocei e nem com muita insistência me rendi aos almendrados que o N. me comprou para o lanche. Hoje engoli um chá de manhã e uma banana à hora de almoço. Tenho um nó a percorrer-me o corpo todo, que me impede de estar bem. Fui uma criança feliz, não tenho propriamente esqueletos no armário, pertenço, com um orgulho maior que o mundo, a uma família nuclear cheia de códigos de cumplicidade e mimo, tenho os melhores amigos que podem imaginar e conquistei algum do reconhecimento profissional que era expectável nesta fase da vida e com o caminho que me propus fazer. Não há razões para ficar assim. Mas a verdade é que fico. E não é fruto da minha imaginação. Suam-me e gelam-se-me mesmo as mãos. E não é mentira contar-vos que há pouco, no hospital, a minha tensão era 18/11. Sou pouco dada a crises existenciais injustificadas e a estados de apatia só porque sim, daí que me custe horrores quando percebo a minha intolerância ao barulho e me reconheço mais na pessoa que está bem é sozinha e calada. Não acho, mesmo, que esteja deprimida. Acho que estou esgotada. E que isso se traduz numa ansiedade palerma, mas, efectivamente, incapacitante. Verdadeiramente incapacitante. As tonturas podem ainda dever-se a uma associação perigosa entre tudo isto que vos descrevi e uma infecção grave no ouvido médio, coisa que me faz estar quase surda do lado direito e ter a permanente sensação de que vou tombar para aquela banda. Mas enfim. Há-de ir passando. Amanhã, outra vez, lá vou de companhia até Lisboa, no lugar do pendura, como alguém incapaz de se bastar, coisa mais odiosa e a que sempre me neguei com todas as minhas forças. Tenho amigos que merecem, mesmo, um T5 duplex com piscina no céu. O N. é um deles. Até porque tem paciência comigo... mesmo quando eu deixo de ter paciência com ele. E é isto. Vou ver se tomo um banho e se durmo cedo.
Compreendo muito bem pelo que estás a passar e tenho a certeza que é uma questão de tempo até superares!
ResponderEliminarBjs
Maria
Cuidado com essa tensão alta. É urgente que descanse assim que possa. O ioga não tem ajudado? As melhoras e, se precisar de ajuda, diga. Já passei por coisa parecida.
ResponderEliminarUm abraço amigo,
Marta
amanhã vou contribuir para a tua animação, R. promessa feita!
ResponderEliminarEspero que melhores rapidamente, pois não consigo te imaginar assim... Mas compreendo... E como! Um grande abraço apertado...
ResponderEliminar... sem a conhecer, fico mais tranquila de perceber que tem quem esteja a olhar por si (e que se sinta confortada com isso)... inquieta-me é este receio certo de que mesmo quando tudo parece bem connosco e com o que nos envolve estamos sempre mto perto da fronteira de passar para uma situação destas, de nos sentirmos perdidos em nós mesmos... desejo-lhe uma recuperação serena e sólida até à superfície dos seus melhores dias :) **
ResponderEliminarnão te conheço, mas acompanho o que aqui vais escrevendo, e tens um dos blogues mais agradáveis e fofos de se ler.. e tenho-te sentido assim mais 'transparente'. mesmo sem te conhecer deixo um braço muito apertadinho, tudo e vai recompor rapidinho
ResponderEliminarMinha querida as melhoras.
ResponderEliminarTambém já passei por muito na vida,tudo vai correr bem vais ver.
Muita força.
Um beijinho do tamanho do mundo
que te está a acontecer? Preocupa-me esta R. Devo ficar preocupada não? Precisas de Mim? Posso ajudar? dar um ombro? beijos CA
ResponderEliminarNão te preocupes. Está tudo encaminhado. Vai passar não tarda. Beijinhos. Saudades*
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