quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Agora, falando muito a sério!

Ando há uns dias para vir cá falar da notícia que dá conta de uma proposta Andaluza, segundo a qual passam a ser limitados e passíveis de rigoroso escrutínio os movimentos bancários dos doentes terminais. Pasmemo-nos todos em conjunto. Vale de muito pouco, mas já é alguma coisa. Sob a capa de medida de manifesto acerto contra a fraude fiscal, mais especificamente contra a evasão aos impostos sucessórios, a medida, a votação, reduz a nada a dignidade do doente terminal, esvasiado, para esta gente, de legitimidade até para movimentar os seus próprios bens. Desde há muito que, por motivos que não vêm ao caso, venho dizendo que há por aí muito boa (?) gente a confundir velhice e/ou doença com incapacidade. Está errado. Está profundamente errado. Esta nova moda de achar que os idosos ou doentes não sabem o que fazem e não podem ser donos do seu nariz, passando os demais a tratá-los como crianças, é uma coisa que me aflige. Não deve haver nada mais triste para um idoso que reduzirem-no a atrasado mental. Lá porque o corpo se lhe desacelerou, isso não acarreta, necessária ou até previsivelmente, um desaceleramento mental. Portanto, se me chocam os contratos de adesão de Lares, dados a assinar a filhos, transformados ad hoc numa espécie de encarregados de educação mas tratados como se juridicamente pudessem dizer-se tutores, esta notícia choca-me ainda mais. Espero, sinceramente, que a coisa não vingue. 

Ontem, outra machadada nos valores do humanismo e respeito pela dignidade que toda a gente enche a boca para defender e mimimi. Os húngaros decidiram que ser sem abrigo ainda não é suficientemente mau e resolveram juntar a essa condição a possibilidade de punir as pessoas que durmam nas ruas de certas zonas das cidades. A minha pergunta é: Está tudo doido, não está?! Os sem abrigo não são um problema do direito contraordenacional e muito menos do direito penal. Muito mal vão as cabecinhas que ainda não tenham percebido que os sem abrigo são um problema social. Ninguém gosta de ver sem abrigo a dormir nas ruas (se passearmos pela nossa Avenida da Liberdade à noite, percebemos que é impossível refestelarmo-nos calma e comodamente na nossa caminha a seguir, perseguidos por aquela imagem triste, retrato de um país a falhar), mas a única maneira decente de acabar com essa imagem avassaladora é dando abrigo às pessoas, não é optando por puni-las. 

Há dias em que ser deste mundo me mergulha numa vergonha imensa. Sinceramente.

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