domingo, 15 de novembro de 2015

Ontem

Ontem dormimos descansados, estafados de uma semana como poucas, acordámos descansados, tomámos o pequeno almoço descansados, demos um jeito na casa descansados, tomámos um banho descansados, vestimo-nos descansados, arranjámos as coisas para levar para casa dos meus pais descansados e saímos de casa descansados, cerca do meio dia e meio. Na rua, em frente à nossa porta, havia muitos vidros de todas a cores e bocados de metal cinzento. Reparámos que o carro do B. tinha uma lateral desfeita. E perdemos o chão. Depois, virei a cara em desespero e encontrei o meu carro, do lado de lá da rua, estacionado num sítio onde eu não o tinha deixado, passível de se reconhecer única e exclusivamente pelos bocados de sacos da Vista Alegre que apareciam entre os destroços. Deixei cair tudo no meio da estrada e com o tanto que chorava e tremia, não sei como não caí também eu. O carro do B. está para consertar, sabe Deus quando. O meu, companheiro inseparável desde o dia 31 de Julho de 2004, em que me apareceu à porta de casa dos meus pais com um laço vermelho em cima porque o curso estava acabado, não tem conserto. O jovem que, sem carta, enquanto eu dormia depois de uma semana de trabalho, me "roubou" o meu carro, levou com ele bem mais que isso. Levou-me a paz que se deseja às noivas a quatro semanas de casarem e as memórias infinitas dos momentos bons e maus que passei naquele lugar. Têm sido anos complicados, estes. Quando estamos a ficar bem, vem uma puta de uma sombra de doença, uns chanfrados de uma Faculdade que permite que as teses não se marquem e as vidas das pessoas fiquem em suspenso, um cliente que faz ameaças ou um jovem sem carta que, numa rua inteira, resolve acertar nos nossos dois carros, e desorganiza-nos ainda mais a vida. Juro que me esforço por ver o copo meio cheio, que sei que em Paris morreu gente e que, é verdade, pode sempre ser pior. Pedia era que, entretanto, parassem os testes de resistência. Estou a ficar mesmo cansada. 

P.S. Nos sacos da Vista Alegre, por onde o reconheci, restavam os cacos em que se transformaram os pratos mandados fazer de propósito para o bolo do nosso casamento. Levantados na sexta à noite na loja para entregar ontem na Quinta. É isto.

P.S. 2: Eu precisava de escrever isto, a ver se páro com os ataques de choro. Trabalhei toda a tarde para tentar abstrair-me, mas não é fácil. Precisava escrever. Mas não quero falar. Não quero falar mais disto, pelo menos para já. 

4 comentários:

  1. só me ocorre uma coisa: Porra!
    esta sexta-feira 13 foi mesmo louca!

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  2. Já passei por isso, acordar ao meio da noite com o meu carro todo partido. O carro dos vizinhos também.

    Mas sabes... tudo passou.

    Um abraço.

    Erva doce

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  3. A minha tia avó recomendou-me colocar uma arruda à porta de casa. Eu não acredito em bruxas mas que as ai, ai, ai! E uma planta fica sempre bem e não faz mal a ninguém. Beijinhos e vai correr tudo bem.

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