O que é ser português? O que nos
diferencia dos alemães ou dos americanos ou de qualquer outro povo do Mundo?
Será que realmente há diferenças assim tão visíveis? No dia da nossa meia-final
do europeu, fomos jantar a um restaurante chamado Cova Funda, curiosamente
também conhecido por outro nome, que aqui me vou abster de referenciar, até
pelo resultado do dito jogo. Ora naquele local é comum ser surpreendido com
fado e seus intérpretes, o que também aconteceu nessa noite e por ali fomos
ficando e escutando aquela música que dizem nos representa, que é a nossa
essência como povo. Devo admitir que durante muitos anos foi música que
abominei e da qual fugia a sete pés, mas diz-se que com a idade, para além das
maleitas, também vem o saber e progressivamente também eu aprendi a apreciá-la.
A dado momento, ouvem-se os acordes quase chorados de uma balada acompanhados
da voz sofrida do fadista, momento tão apropriado ao estado atual do país, em
que sofremos com o desemprego, com os cortes de salários, com a miséria, ai
pobres de nós que o Mundo acaba e ninguém nos salva e ali ficámos uns minutos a
ouvir e a carpir mágoas comuns em silêncio. Logo a seguir, quase sem pausa para
respirar, irrompe um daqueles fados vadios, cheios de trinados e cantares
desgarrados, que a todos entusiasma e surgem as palmas ritmadas e os sorrisos
abertos e todos os males são espantados, como se se estivessem a sacudir
lençóis garridos para estender na cama lavada.
Ao pensar naquela sequência de
músicas, pensei que também nós portugueses somos um pouco assim, capazes de
grandes depressões, momentos em que estamos à beira do abismo a olhar para o
fundo e quase pedimos que venha alguém e nos dê um pequeno empurrão, eis que do
nada surge uma aberta nas nuvens negras e o Sol começa a brilhar tão
intensamente que esquecemos todos os problemas, todas as preocupações e
voltamos a querer viver e estar e beijar e dançar. Não é certamente só isto que
nos distingue, esta capacidade de nos reinventarmos, de fazer das fraquezas
forças, mas parece-me que é claramente coisa nossa, intrínseca e intemporal e
que nos permite tantas vezes avançar, mesmo com tudo contra nós. Por um lado
era bom sermos daqueles povos que estão sempre no topo das listas de
felicidade, mas acho que assim apreciamos mais a viagem, sentimos mais todas as
incidências do trajeto e por mim (quase sempre) gosto que assim seja.
Porque já há uns tempos que ele por cá não dizia nada.
Já assim assisti a alguns fados no Cova Funda (sim, e espanhol...) e realmente os jantares pela porta traseira (cave-cova), eram os preferidos... os mais escondidos. Os melhores.
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