segunda-feira, 2 de abril de 2012

Uma questão de pontuação

Costumam dizer que sou vírgulodependente. Concordo. Admiro a capacidade das vírgulas de nos imporem uma pausa sem quebrarem o sentido de um discurso. As vírgulas dão o compasso da declaração,  dão espaço a que respiremos e retomemos a fala com mais alento ainda. Uma vírgula não tem cor, nem cheiro, nem textura. Uma vírgula simplesmente acontece. Aceito, com semelhante deslumbre, o valor de um ponto final. Gosto da organização que um ponto final nos dá. O ponto final não é um gole de ar que se bebe com pressa de prosseguir viagem. Um ponto final, pelo contrário, assume o lugar do tempo, da reflexão, da serenidade de quem se arruma por dentro. Mas gosto também da sensação de assunto arrumado que só um ponto final seguido de um parágrafo personificam. Adoro. Adoro a liberdade que só os novos parágrafos nos lançam aos pés, como que impelindo-nos a começar outra vez, a mudar de assunto, a virar a página. Nunca percebi os ponto e vírgula e desprezo-os amiúde. Vejo-os como um símbolo "nem carne, nem peixe" que me dá aflição, que deixa coisas penduradas, mas segue sem olhar para trás. Não gosto deles. Tenho a paciência e a impaciência, a melancolia e a febre, a dureza e a fragilidade das ambíguas reticências. Tanto lhes imprimo o sentido da esperança como a raiva dos finais em aberto a que urge dar espaço em novos parágrafos. Cultivo, nos textos e na vida, o encantamento das exclamações e a necessidade de me sentir segura que só respostas a interrogações julgam oportunamente. Não há, em mim e na minha forma de me reescrever, nada que não pontue deliberadamente. Da última vez que o fiz, da última vez que achei que podia deixar o caminho à interpretação do leitor, a liberdade que lhe entreguei permitiu-lhe pontuar-me a vida toda mal. Cheia de pontos e vírgulas. Já disse que não gosto de pontos e vírgulas?! Pois. Volto atrás. Recomeço. Leio tudo desde o princípio. Reaprendo-me o sentido. E pontuo-me. Preciso só do tempo mediano que nos dá o senso da crítica que falha a quem lê o mesmo texto muitas vezes seguidas. Não é grave. Da próxima vez que olhar cada linha, hei-de saber, finalmente, caçar as dúvidas e organizar os parágrafos tão bem que a vida me estenda aos pés, mais uma vez, um recomeço inteirinho. Os textos são assim. Um amante de quem não desiste de os ler e escrever, escrever e ler.

13 comentários:

  1. E quem me dera a mim saber usar as virgulas, não sei, nunca o soube fazer.
    Muito do que faço precisa de ser lido e relido porque não as sei usar!
    É de facto uma limitação minha que nunca consegui ultrapassar :(

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  2. Só tu para fazeres um post magnífico sobre pontuação [ponto de exclamação] [ponto de exclamação]

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  3. Perfeito, fácil de aprender e, te confesso, tenho sérios problemas, atualmente, com pontuação.
    bom te ler.
    obrigada.
    beijos no coração
    maria

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  4. Obrigada a todas :)
    Beijinhos e voltem sempre, que gosto de vos ver a passar por cá!

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  5. Comencei a ler o teu blog como tentaiva de aprender a escrever....

    erva doce

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    1. Oh querida erva doce, estava a ver que não voltavas cá. Estou desde sábado para te dar os parabéns, mas não tinha como :)
      Quanto ao mais... olha que aqui não se aprende grande coisa! Mas volta sempre :)
      Beijinhos*

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  6. Pois, mas tenho uma filha que anda com a gramatica atrás.

    Obrigado, toda a gente( especial) se lembrou de mim.

    Até tive direito a um bolo com um pau de fosforo , das minhas amigas emigrantes.

    Estou mesmo contente....

    erva doce.

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  7. Simplesmente magnífico este post!! Querida R., continuas a surpreender com a tua escrita!!! Bjokas, és uma estrela***

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    1. Estrela?! Mas tu não fazes a coisa por menos?! Não és nada exagerada, não, rapariga!!! Até sexta, para a grande aventura :) Beijinhos*

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    2. Sim, estrela! Já n é a primeira vez que te digo isso! O teu dom da escrita é fabuloso!! Bjokas e até sexta:))

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  8. Caramba! Só fiquei triste por agora ser uma desgraçadinha que trabalha de sol a sol e só descobre uma preciosidade rara de texto assim com vários dias de atraso! Genial, ouve o que te digo!

    (e beijinhos erva doce!)

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    1. M-e-n-o-s, minha Raquel, menos :)

      Beijinhos tão grandes, tão grandes para ti (só mandaste para a erva doce, mas eu faço de conta que também eram para mim :)

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