quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Poemário essencial


Dorme, meu amor, que o mundo já viu morrer mais
 um dia e eu estou aqui, de guarda aos pesadelos.
Fecha os olhos agora e sossega ― o pior já passou
 muito tempo; e o vento amaciou; e a minha mão
desvia os passos do medo. Dorme, meu amor  ―

a morte está deitada sob o lençol da terra onde nasceste
e pode levantar-se como um pássaro assim que
adormeceres. Mas nada temas; as suas asas de sombra
não hão-de derrubar-me ― eu já morri muitas vezes
e é ainda da vida que tenho mais medo. Fecha os olhos

agora e sossega ― a porta está trancada; e os fantasmas
da casa que o jardim devorou andam perdidos
nas brumas que lancei no caminho. Por isso, dorme,

meu amor, larga a tristeza à porta do meu corpo e
nada temas: eu já ouvi o silêncio, já vi a escuridão, já
olhei a morte debruçada nos espelhos e estou aqui,
de guarda aos pesadelos ― a noite é um poema
que conheço de cor e vou contar-to até adormeceres.

Maria do Rosário Pedreira

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