Tenho cada vez mais para mim que uma das principais causas da solidão nas cidades é a inexistência de soleira de porta, assaltados que fomos nas terras grandes pela construção em altura, metidos que estamos, cada vez mais, naquilo a que o meu pai chama caixas de fósforos. A soleira da porta é um local de romaria diária, onde se sacodem problemas e se partilham alegrias, se aprende a falar na vida dos outros, mais ou menos como os outros falam na nossa, enfim. Na soleira da porta as novidades são fresquinhas, mas quando alguém está aflito, sabe que na soleira da porta encontrará alguma solução ou, pelo menos, uma palavrinha de conforto. Nas cidades há uma solidão fria de quem não conhece o vizinho da frente. Nas aldeias, isto é impensável. Tem um lado mau, esta proximidade. Meio mundo sabe a que horas saímos e chegamos, se repetimos umas calças na mesma semana e a matrícula do carro de todos os elementos do sexo masculino com quem nos damos, mas enfim, não se está sozinho, ou, pelo menos, tanto. E acho piada ao vagar de quem se senta na soleira da porta um dia depois do outro, muitos, todos, só para jogar um bocadinho de conversa fora. De quem não se fica pelo sofá e pela televisão, pelas paredes de casa e por uma imensa solidão. A soleira da porta é uma instituição.
Excelente perspetiva...
ResponderEliminarEu substitui a soleira pelo telemóvel :);)
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