Vão a caminho de um local no horário em que já deviam estar a chegar a outro local; torcem muito para apanhar à vossa frente um comboio turístico.
De nada.
Vão a caminho de um local no horário em que já deviam estar a chegar a outro local; torcem muito para apanhar à vossa frente um comboio turístico.
De nada.
Sabes que tens potencial para desinfluenciar as pessoas quando, enquanto os outros pais conversam e riem, passas as horas de treino de futebol do teu filho dentro do carro, a fazer provas de artigos científicos para publicação!
"Quando for grande quero voltar a ser pequeno,
nascer outra vez, moderar as ambições..."
Freire Falcão
Expliquem-me, mas com calma, para ver se eu alcanço entender, como é que é possível que eu tenha acabado o curso há 20 anos. 20 anos? Como assim, 20 anos?! Onde se enfiaram afinal os 240 meses que o calendário diz que passaram?! Como assim, 240 meses?! O que raios andei eu a fazer nos cerca de 7300 dias que pelos vistos se puderam contar de lá até agora?! 7300 dias?! Está tudo doido.
Vamos por partes:
Em 2004 acabei o curso, fiz turismo com a G. e comecei o estágio.
Em 2005?
Em 2006 comecei a trabalhar a sério, no escritório, no Centro e na Faculdade, publiquei o primeiro texto, fiz a primeira conferência e comecei a dar aulas.
Em 2007?
Em 2008?
Em 2009 defendi o mestrado, conheci a Terceira, voltei à Madeira, publiquei o primeiro livro, inscrevi-me no doutoramento, voltei a Florença e fiz férias sozinha.
Em 2010 fui viver sozinha e passei a dar aulas quase todos os dias.
Em 2011 consegui a Bolsa, conheci Madrid e Montico.
Em 2012 coordenei o primeiro curso e fui a Viena.
Em 2013 fui para Cáceres, regressei a Madrid e fiz uma road trip com o B até Pavia.
Em 2014 entreguei o doutoramento, voltei ao Funchal e a Roma e fiz umas orais muito sérias com uma carteira da "Anita na quinta".
Em 2015 voltei aos Açores e a Florença, casei e fui à Lapónia.
Em 2016 dei aulas em Saragoça, defendi o doutoramento, engravidei e mudei de casa.
Em 2017 fui mãe do F.
Em 2018 engravidei a fui mãe da M.
Em 2019 voltei a São Miguel.
Em 2020?
Em 2021 voltei a Paris.
Em 2022?
Em 2023 voltei aos Açores, dei aulas em Florença, conheci Antuérpia, levei os miúdos a Londres e comecei um projecto que saiu da minha cabecinha e que está a ser incrível.
...
O tempo passa de facto demasiado lento quando estamos na fila da casa de banho e numa velocidade estonteante quando nos falta acabar um artigo científico, vamos de férias ou paramos para apreciar o sorriso dos nossos filhos. Nestas alturas, o tempo voa. Ele não voa como uma gaivota, a apreciar o vento e a depenicar no ar as gotinhas de mar, ele voa como um caça pronto a lançar um míssil com um bilhetinho a dizer "Ontem já é amanhã".
20 anos?! Custa-me mesmo a acreditar...
Mais de 5 anos depois, apeteceu-me. Experimentei duas ou três outras moradas neste meio tempo, que escrever faz-me falta muitas vezes e calar-me é de tempos a tempos ensurdecedor, mas esmoreci sempre depois do primeiro post. Há uma relação de confiança com este sítio, que a bem dizer agora podia chamar-se outra coisa, mas é o que é. Tenho aqui o conforto dos que me identificam, mas respeitam que eu queira permanecer R. para o Mundo. É um mundo pequeno. E mais de 5 anos devem ter levado gente que nunca mais cá volta. Mas dita um certo egoísmo que eu seja franca: isto é muito mais para mim do que para outra pessoa qualquer. R., 42 anos, 2 filhos e 3 empregos. Escreve porque lhe falta o ar. Não encarreira com o Instagram e usa o Facebook para divulgar trabalho e algumas pérolas inadiáveis das crias. Às vezes opina por aquelas bandas, mas tanto lá passeiam a professora da primeira classe, como ex alunos que agora são juízes e deputados e não lhe apetece que todo o bicho careta pasme a ler o que escreve. Não é vergonha, nem vaidade. E também não é modéstia, nem da falsa. É assim porque isto é uma casa onde durante 10 anos fez sentido contar a vida e que nunca me deu chatices. Há muito mais interesse em ver o que as pessoas vestem ou comem, do que em ler o que escrevem. Sobretudo se escreverem sobre elas e as suas vidas normais. Isto é um blog tendencialmente desinfluente, demasiado cheio de vida banal para interessar a marcas. E isso, pensando que não, permite a uma pessoa dormir "com a chave no trinco". Entrem e sirvam-se. Tenho as janelas abertas, com a casa a arejar, que, em princípio, desta vez venho para ficar.