Hoje, a partir das 14h, farei parte de um júri de provas mestrado. A seu tempo se percebeu que talvez não se justificassem as provas de quase três horas de que ainda fui vítima há uns não muito distantes sete anos. E então, concedeu-se, podiam ser marcadas mais provas num só dia, ou até, numa só tarde. Ocorre que a burocratização do ensino e a mania (que me fere a vista diariamente) de fazer de toda a gente mestre levou a esta coisa fantástica de eu hoje ter marcadas sete provas de mestrado numa tarde. A minha faculdade fecha portas às 20h, o que significa que, no máximo, podemos dar a cada aluno a dignidade de uma prova de 45 minutos. Sobram-nos outros 45 que, dividindo por sete, permite uma discussão e fundamentação de nota de 6 minutos e 4 segundos por prova. Não contabilizo, nestes meus números redondos, esse imprevisto a que todo o custo se procurará obviar de, por exemplo, um dos elementos do júri precisar de fazer chichi, notem bem. Em orais de melhoria de nota demora-se, com muita normalidade, 45 minutos ou mais. Entende-se que é preciso calma a debater as coisas, que não estamos a virar frangos, que há que perceber se a pessoa pensa, raciocina, "dá o salto", ou se apenas decorou e é uma enorme fonte de frases feitas que nunca, porém, chegou a entender bem. Hoje à tarde, eu terei de fazer mais omoletes, mas com menos ovos. Não vai de lá sair ninguém com penal feito que é coisa que, a bem dizer, deve ter-se por dada e garantida - penal, aliás, mais que feito, deve estar bem sabido, que a pessoa afinal meteu-se por esses mesmos caminhos à procura de um grau académico acima. Vão de lá sair mestres. E, contudo, reparem, eu não posso demorar-me mais que 45 minutos com cada um. Espero que me respondam à primeira à não mais que meia dúzia de inquietações que lhes levo, em esforço verdadeiramente estúpido e por certo pouco frutífero de, com três penadas, perceber logo se pensam ou só debitam. Este, assim, tal qual vos conto, é o estado da Universidade. Não é só da minha e isso dá-me ainda mais pena. Porque, de tão banalizados que foram os atropelos ao que é ser-se académico, torna-se cada dia mais difícil permanecer, ser para lá dos papéis e dos prazos, garantir que os mestres que eu ajudarei a fazer não me envergonharão já amanhã. Há dias em que ser professora universitária se distancia muito pouco de ser caixa de supermercado, a passar produtos pela máquina, de ser vendedora da Remax, a trabalhar por objectivos, de ser empreiteira de chave na mão em tempos de chuva, a fazer à pressa para cumprir prazos. Há dias em que eu tenho mesmo pena de fazer parte deste sistema. E em que, com franqueza, só me apetece mudar de vida e voltar a trabalhar numa Universidade a sério. Assim as houvesse...
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