sexta-feira, 4 de julho de 2014

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Eu choro muito. Choro muito de tristeza e choro muito de alegria. Expulso as mágoas e espalho as alegrias com a água a sair-me pelos olhos. Choro de alegria lágrimas miúdas, que se formam nos cantinhos dos olhos e não chegam a escorrer. Não fico de nariz vermelho, mas encho-me de calor. Transpiro e é só alegria a sair-me pela pele. Pela pele toda, poro a poro, a alegria a multiplicar-se, a perfumar-me o ar à volta, a contagiar. Mas choro de tristeza lágrimas gordas e que se escusam a viajar sozinhas. Formam rios inteiros a desaguar-me no pescoço e no peito. Vêm com funguices de nariz e um frio muito frio, um desconforto muito desconfortável e um negrume que se abate sobre o meu peito e me mina o momento, o dia e a vida. Naquele parêntesis em que é tudo breu em mim, choro umas lágrimas profundas de uma dor que nunca desferra. Nem sempre choro essas lágrimas maiores, como regatos de água, mas maiores, nas perdas. Às vezes, aí, calo-me fundo e choro para dentro, como a ver se o barulho da água a correr-me em direcção ao coração o desperta do sono mudo em que mergulha nas dores irrecuperáveis. Não é tanto nessas que as lágrimas se atropelam nos meus olhos. É nas dores dos dias, nos episódios espinhosos do quotidiano, nas falhas da vida normal, nos engodos brutais das irreflexões. O que me faz cair em desgosto frio é o drama que passa, que vai passar, mas magoa e perturba, vira a mesa e fala mais alto. É aí, aí mesmo que os meus olhos viram nascente e o frio me entra todo cá dentro e eu passo a dar o meu reino e mais um doce por um abraço. Caladinho.

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